Saturday, August 24, 2013

O ressentimento das elites

Lembro-me que quando foram lançados os celulares no Brasil, ter um aparelho era um símbolo de status que devia ser mostrado com alarde e pompa. Logo os dispositivos foram se proliferando, ao ponto que hoje o Brasil tem mais celulares do que gente! Acho que tem gente dando celulares até para o cachorro.

Daí vieram os smartphones, o que deu uma chance para o pessoal chegado num status a provar novamente um gostinho de exclusivismo. Não demorou muito. Não há tantos smartphones no Brasil, ainda, porém há um número suficiente para tirar a aura de exclusividade do produto.

Foi assim com telefones normais, com video-cassetes, computadores de mesa, laptops, até com carros. Quando era criança, ter um carro no Brasil era coisa séria. A frota no país não passava de 2 milhões de carros. Os anos foram passando, as coisas mudando, e daí, mais recentemente, até gente da classe C começou a comprar carros, financiando a perder de vista.

Curiosamente, como o brasileiro de classe média para cima tem muita consciência de status, quase a nível de obsessão, algumas pessoas mais abastadas, parte das "elites" do país pelo jeito sentem ressentimentos quando "gentinha" começa a ter acesso às coisas que antes eram domínios seus.

O mesmo ocorre na área de viagens, principalmente viagens internacionais. Houve época em que viajar para o exterior era coisa para classe A mesmo. Depois a classe B começou a ter acesso, e hoje, até a classe C pega o seu passaporte e se manda. A mesma revolta aflige aqueles elitistas que lembram com suspiros os "bons tempos".

Acabei de ler o livro "Guia Politicamente Incorreto da Filosofia", de Luis Felipe Pondé, o qual recomendo.

Entretanto, fiquei estarrecido com a visão do escritor em relação ao assunto viagens. Disse que não quer mais viajar, basicamente, por dizer que virou coisa de "gentinha". Aeroportos cheios, crianças gritando, locais turísticos sendo profanados. Já não seria mais "chique" viajar.

O autor dá uma dica de que não seria bem os aeroportos cheios, ou crianças gritando, ou gente profanando locais turísticos que afetaria a sua sede de viagens; começa o livro narrando uma viagem à Islândia, um local que lhe agradou justamente por não ser cheio de turistas. Ou seja, ainda rende algum Ibope dizer que viajou para a Islândia.

A realidade é que é puramente uma questão de status. Paris, Roma, Nova York e Londres sempre estiveram cheios de turistas, pelo menos nos últimos 40 anos. O que é diferente é que hoje em dia não é muita vantagem para um brasileiro de alta classe dizer que esteve alguns dias nas maiores metrópoles do mundo, pois brasileiros de um estamento mais baixo não só tem condições, como viajam para estes locais. Por isso perdeu-lhe a graça, Sr. Pondé.

Como perdeu a graça fazer farol com celular, carro, laptop, etc.

Vaidade das vaidades, Pondé, como dizia o Rei Salomão. Quem viaja para outros países para absorver culturas diferentes, e não para dizer que escreveu um ensaio em Kensington, vai continuar viajando.

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