Wednesday, April 30, 2014

Disfunções da imprensa -bananas, NBAs e EBs

Entendo a lei da oferta e procura. Entendo que, com a internet, a imprensa, o jornalismo, assim como diversos outros setores, tiveram que se reinventar, correndo o perigo de tornarem-se redundantes. Sinto isso na pele, pois o setor de traduções foi um dos mais afetados pela revolução tecnológica. Afinal de contas, quando o google faz traduções de graça, é difícil você convencer alguém que pago é melhor, pois o google é o google, e é grátis.

Obviamente, o mesmo ocorreu com a imprensa, principalmente o jornalismo clássico, de jornais diários, com rotativas, distribuição em banca. Muitos jornais já se foram para o cemitério dos periódicos nos últimos anos, e alguns outros parecem seguir celeremente o mesmo caminho.

Tudo ficou muito bagunçado hoje em dia. O que era imprensa séria, há vinte anos atrás, hoje é obrigada a dar grande ênfase às novelas globais, BBBs e cada passo da Madonna, pois jornalismo virou entretenimento, entertainment puro. Há um grande jornal que não perde a oportunidade de colocar matérias na sua página principal sobre mamárias (câncer de mama, amamentação, etc) só para poder ilustrá-las com vistosas peitamas em flor. Isto num jornal que um dia foi considerado o mais influente do Brasil.

Sim, é a lei da oferta e procura. Poucos ainda continuam pagando pelo jornal em banca, menos ainda assinando na internet, e para chamar leitores online, e rezar que alguém clique nos anúncios, é preciso as peitamas, especulações sobre a calcinha da Lindsey Lohan (ou falta da mesma), sem contar com uma dose extra-forte de tudo que é fútil, e "da hora".

A imprensa, o jornalismo, diria, tem a função de reportar os acontecimentos, porém, também tem um componente proativo. E imagino que este componente proativo de informar tendências (econômicas, políticas, etc, estou falando de coisas sérias, do futuro da humanidade) se não se foi completamente pelos ares, está próximo de ir.

Todo tipo de racismo é sem dúvida lamentável, e deve ser relatado. Sinto isso na pele, afinal de contas, moro no exterior há 38 anos e sou objeto de preconceito de tudo que é lado. Além disso, sou surdo. Mesmo assim, achei um pouco desmedido o espaço que foi dado, tanto no Brasil como nos EUA, a dois eventos de racismo, os dois em esportes populares - o caso da banana no Dani Alves e do racismo declarado por um dono de um time de basquete da principal liga do mundo, a NBA. Fizeram bem os jornais de relatar os acontecimentos, porém, não se parou de falar no assunto, ao ponto que o Facebook de alguns dias atrás parecia o vale do Ribeira, de tanta banana. Chegou uma hora que ficou cansativo DEMAIS.

Nestes últimos dias estou lendo um livro sobre a derrocada das empresas X. Confesso que sempre olhei com um pouco de suspeita a rapidíssima inserção das jovens empresas no panteon dos gigantes mundiais, rankings de Forbes, etc. Sou diplomado em geologia, e sei um pouco das dificuldades tanto do ramo de mineração como petrolífero, sob um ponto de vista técnico. O que mais me supreendeu, entretanto, foi saber que o mesmo senhor que estava à frente destas empresas, tinha um histórico curioso no mundo dos negócios, num passado recente, e em diversos setores. As mesmas hiperbólicas alegações feitas por EB no caso das X, foram feitas na sua empresa de jipes e no caso da empresa de logística que seria a maior concorrente dos Correios em um par de anos. E o resultado das duas foi igual.

Não se trata de dizer que houve desonestidade, no strictu sensu, não acho que houve. Acredito que EB realmente cria em tudo que disse, tem doses cavalares de otimismo, muito carisma e sabe convencer. Sabe vender seu peixe como poucos. Além de ter outros atributos como boa aparência, eloquência, ter sido esportista bem sucedido, falar diversos idiomas e ter sido casado com uma modelo famosa. O problema não é EB. Ele fez o que todos nós fazemos diariamente ao sair de casa e ir para o trabalho, tentar vender nosso peixe.  

O que eu não entendo é como a imprensa, inclusive os supostos jornais "sérios" se deixou levar pelas dezenas, centenas de comunicados de imprensa, coletivas, comunicados de fatos relevantes, aparentemente sem qualquer filtro ou ponderação...Por que, se não me falha a minha memória, nenhum jornal ousava questionar em nada a meteórica ascenção do império X, lá por volta de 2006 a 2010, todo mundo batia palminhas, achava lindo, plausível e factível.

Não precisava ir muito longe. Seria saudável pelo menos alertar, dizer para as pessoas que tivessem cuidado, informar que alguns dos empreendimentos anteriores do Sr. EB não tinham alcançado tanto sucesso, trazer à tona uma discussão.  Não se trataria de esculhambar, de difamar o empresário, algo tão insidioso quanto o racismo, a meu ver. Porém, a função de alertar, de proatividade, parece que nossa imprensa não faz há já algum tempo. Limita-se a narrar os fatos quando a bomba explode.

Muita gente acabou perdendo dinheiro, o que é normal no mercado de capitais, até mesmo com empresas em franca atividade e de sucesso, porém, imagino que muita gente que não podia perder, o fez por falta de informação, omissão da imprensa.

Onde estava a imprensa em 2006, 2007? Por que ler um livro a posteriori não resolve muita coisa. Aliás, não resolve nada para quem perdeu as calças.  

Na realidade, na época provavelmente você teria teria muitos artigos ainda sendo escritos sobre as saltitantes peitamas de Janet Jackson no Superbowl, as capas da próxima Sexy, ou relatórios constantes sobre as desventuras de nossos futebolistas no Uzbequistão ou Farofistão. Ou seja, disfunção. Disfunção pura.

Wednesday, April 23, 2014

Pelo jeito, São Paulo paga o pato novamente

Amo patos. É o meu bicho predileto, e todos que me conhecem bem sabem disso. Acham estranho inicialmente, porém, eventualmente começam a postar patos no meu facebook, compram patos de borracha para mim no mundo inteiro, e descobrem que também gostam de patos.

Pagar o pato, entretanto, não é uma expressão legal. Não chega a ser pejorativa, pois quem paga o pato geralmente não é culpado de nada. Não tenho a mínima ideia de onde vem a noção de que pagar por um pato é uma coisa negativa. Eu pagaria por um pato sem qualquer reserva. Já se fosse pagar uma barata, aí seria pagar mico. Bom, estou complicando esta fauna toda.

Voltemos ao foco deste texto. São Paulo, tanto a cidade, como o Estado, estão acostumados a pagar o pato. Queiram ou não, é um fato histórico. Leiam muitos livros de história e economia, e chegarão à mesma conclusão.

Não sou dado a bairrismos baratos, portanto, não me acusem de bairrista. Nem tampouco estou acusando ninguém de nada. Só estou narrando os fatos - se podiam ser previstos, não tenho a mínima ideia.

Hoje uma colunista de um jornal paulistano disse que os hoteis da cidade estão um pouco desesperados com relação à Copa do Mundo. Não precisa ser Pascal para concluir que hoje SP tem o maior parque hoteleiro do país. Não só tem o maior número de quartos, como também a melhor qualidade, tendo suplantado o Rio de Janeiro nos anos 90.

Entretanto, os hoteleiros de SP estão bastante preocupados com sua taxa de ocupação durante a realização da Copa. Enquanto no Rio de Janeiro somente há algo como 8% de quartos disponíveis, mais de 60% da capacidade de SP ainda está sem reservas! Na realidade, a cidade é, de longe, a sede da Copa na pior situação. Justo a cidade que tem melhores condições de receber turistas às pencas!

Ocorre que, durante a Copa, os executivos, que geralmente enchem a cidade, em visitas a clientes, fornecedores ou feiras, simplesmente fugiram de SP! Entre outras coisas, os preços das passagens assustam, os hoteis também estão exagerando (têm lá sua culpa os hoteleiros) e o viajante internacional já está de sobreaviso que a já cara Pauliceia provavelmente ficará mais cara ainda durante o torneio futebolístico. Os executivos não foram substituídos por hordas de torcedores, afinal de contas, a cidade sediará um número relativamente pequeno de jogos. Imagino que muita gente esteja fazendo sua base no Rio de Janeiro, convenhamos, uma cidade mais bonita do que SP.

Isso não seria tudo. Enquanto os hoteis esiverem à míngua (e os restaurantes e outra infra estrutura de atendimento provavelmente, também estarão às moscas), o Aeroporto de Cumbica provavelmente estará entupido de gente chegando e fazendo conexões para Natal, Cuiabá, Manaus, etc. Isto porque a maioria dos voos internacionais que chegam no Brasil pousam em SP, e querendo ou não, a cidade deverá ser usada de hub.  O coitado do torcedor internacional que quiser seguir seu time em jogos em Manaus e depois em Porto Alegre vai sofrer. E provavelmente, passará por São Paulo.

Ou seja, o impacto econômico da Copa em SP provavelmente será negativo. Não se tratou de trocar seis por meia dúzia, e sim trocar seis por um. Um pato.

Monday, April 14, 2014

Perdeu o futebol

O que é o gol? Vem da palavra GOAL em inglês, que significa meta. Ou seja, um futebol sem gols é um futebol sem metas atingidas.

Fico feliz quando meu time marca muitos gols, principalmente durante um específico campeonato, por que atingiu metas. E foi assim com o Santos neste Campeonato Paulista, até encontrar o paredão do Ituano.

Não sou mau perdedor. Em última análise, o SFC perdeu o campeonato por que desperdiçou algumas chances nas duas partidas da final. Porém, no âmago da história, fica a vitória do futebol-paredão retranqueiro defensivo feio, sobre o futebol rápido, cheio de gols, metas atingidas. Em última análise, o Ituano foi mais eficaz  do que o Santos, ficando 580 minutos sem ser vazado. O SFC até encontrar o paredão tinha uma média de 3 gols (metas) atingidos por jogo.

A meu ver, quem sabe o primeiro a repensar seu estilo de jogo, infelizmente, seja o próprio Santos. É notório que o Brasileiro é muito mais difícil do que o Paulistão, tanto é que o fenômeno Neymar nunca fez nenhuma diferença nos campeonatos brasileiros, e no ano passado os paulistas deram vexame no Nacional. Seria o fim das linhas de ataque com três jogadores, e início de meio de campo embolado com cinco, a maioria volantes e um panaca sozinho lá na frente.

Gostaria que o Santos continuasse a jogar o futebol alegre dos primeiros meses do ano, porém, me parece que inicia uma nova era no futebol brasileiro. A era da parede. Uma pena.

Como bom perdedor, meus parabéns ao Ituano. Que faça uma boa série D do campeonato nacional e volte à obscuridade nos próximos anos.  

Thursday, April 10, 2014

Eu quero uma casa no campo

Quem não conhece a grande música de Zé Rodrix, interpretada de maneira tão magnífica por Elis Regina?

É bem possível que o pessoal da nova geração não conheça a música, ou não conheça a letra. De fato, é bem possível que logo a letra se torne completamente anacrônica.

Explico.

Há um trecho da canção, quem sabe, o mais conhecido e legal, que diz "onde possa levar meus amigos, meus discos e livros e nada mais". É para isso que o autor quer uma casa no campo.

Para a geração atual isto se reduziria a "onde possa levar meu tablet". Ou meu laptop ou smartphone.

Não sou avesso à modernidade. Trabalho com computadores há quase trinta anos, toco sintetizadores há 33, e meu carro é super-moderno. Estou cercado de aparelhos e softwares da hora. Minha aversão ao celular tem mais a ver com minha deficiência auditiva do que ódio à tecnologia. Não gosto de muita miniaturização por que tenho 10 de miopia, e outras "pias".

Raciocinemos. Discos já são uma coisa do passado há muito tempo. Foram substituídos por CDs. Demorei um pouco a engolir os CDs, porque, para mim, um LP era um evento. Lindas e imensas capas, encartes, sem contar o prazer de escolher na loja abarrotada de discos os álbuns que iriam consumir grande parte da minha exígua grana. Os CDs diminuíram um pouco a dimensão do evento (e dos encartes), e eventualmente a digitalização se tornou um tiro nos pés da indústria fonográfica. Hoje, lojas de CDs são poucas, e as existentes, contém pouco produto. Sim, você vai achar os lixos das Lady Gagas e Miley Cirus da vida, e basta. O prazer de mostrar uma estante cheia de LPs, ou mesmo de CDs, logo será uma coisa do passado, embora exista uma tentativa de ressuscitar os LPs. Hoje música, o consumo de música, é o consumo de arquivos digitais, seja online ou salvos no seu computador, tablet ou celular.

Livros...aqui nos Estados Unidos quase não existem mais livrarias. A Barnes and Noble, que quase monopolizou o mercado nos últimos 20 anos, agora começou a fechar suas lojas às pencas, visando competir tête-à-tête com a Amazon.com e vender pela internet. A proposta ainda é vender livros de papel, com capa, cola, e tinta. Não por muito tempo. Mais cedo, mais tarde, vão forçar a barra e fornecer a maioria dos livros somente em formato digital, algo que é facilitado pela plataforma da loja online. Sim, você ainda vai poder comprar açucarados ou bobos best-sellers nas suas versões em papel em super-mercados e farmácias, porém, o livro em papel corre o risco de ser o próximo mico-leão dourado neste país.

Os discos e livros do poema de Zé Rodrix estão se tornando quase exclusivamente digitais. Basta ter bastante memória no disco rígido,  ou um bom número de pen-drives, e tudo caberá numa caixinha.

Só que até mesmo os amigos estão se tornando digitais, quase exclusivamente digitais, devidamente classificados e catalogados nas listas de contatos de celulares e aplicativos, ou em redes sociais. Sim, as pessoas ainda se reúnem (porém, quando estão juntas não param de olhar seus dispositivos de comunicação, cabe notar), mas em grande parte nossos contatos são virtuais, curtos e superficiais.

Ou seja, a ideia de um grupo de amigos se descambar para o campo, para ouvir discos e ler livros, é algo tão antiquado quanto as termas romanas! Para que tudo isso, crie-se um APP legal, todo mundo se reune num chat e compartilha arquivos digitais, e ninguém tem que sair de casa!!!

Ainda bem que o Zé - e a Elis - se foram antes de ver esse dia chegar.

Thursday, April 3, 2014

Jaroleta

Considere a palavra badalhoca. Segundo um amigo, jornalista de mão cheia e autor de um livro de crônicas, o vocábulo significa algo assim como tranqueira. De fato, a palavra, de tão relevante, inspirou até uma crônica homônima. Já para outra pessoa, tão confiável quanto o escritor, badalhoca significaria aquele resíduo sólido que insiste em permanecer no término da cavidade retal, mesmo após criteriosa limpeza mecânica. Convenhamos, são duas definições bastante díspares e confundir uma badalhoca pode trazer sérios distúrbios à saúde.

Quanto à jaroleta, ouse perguntar ao google. O sabichão do mundo virtual não retorna sequer uma instância desta palavra no nosso idioma. Nota: pronuncia-se jaroleta com “r” curto, e não dois “rr”.  Entretanto, nos idos de 1974, surgiu verbalmente a jaroleta brasileira entre o nosso meio, os estudantes da oitava série do Colégio Macedo Soares em São Paulo, ao mesmo tempo em que se popularizava a palavra “panaca”, esta sim bastante difundida, embora um tanto boco-moca hoje em dia.

De uma coisa sei. Apesar de progidiosa criatividade, não fui eu o autor do termo no vernáculo. Além de arranjar apelidos para os colegas, naquela altura das coisas já tinha criado diversos países, um continente, centenas de pilotos, marcas de carros e empresas dos mais diversos setores, canais de televisão, times de futebol, cantores e músicos no meu próprio universo, além de compor diversas músicas, com começo, fim e meio. Até um mini samba-enredo.  Criatividade com uma propensão ao detalhe não me faltava, porém não fui eu o pai da jaroleta, que fique claro.

Tampouco sei o que significava. Alguns podem atribuir ao sonoro e silábico termo um significado fálico. Outros, mera interjeição. Porém, tinha lá a jaroleta algo de proibido, como muitas coisas eram no País. Parece-me, entretanto, que era um substantivo de significado assaz obscuro, mas certamente não era uma conjugação do verbo jaroletar, nem tampouco um adjetivo. Não era um nome próprio também. Mas a jaroleta entusiasmava a nossa imaginação.

Alguns filósofos gregos julgavam que palavras tinham vida própria, e vinham ao mundo captadas, descobertas por mentes iluminadas – advinhou, filósofos. Já eram corporativistas os platões de plantão, certamente teriam criado fartas pensões para eles mesmos, se pudessem. Certamente acho isto um exagero, principalmente num mundo em que neologismos e bordões dão à luz às pencas. Quem criou a jaroleta, portanto, não deve ter sido um gênio, porém, merece crédito. Sua criação não pode ficar fora do universo virtual.   

Não sei se algum antigo colega vai se lembrar da pseudo-elocução. Quem sabe, alguém até possa assumir a paternidade da expressão, com um orgulho alqaedista.


Para mim, resta somente fazer jus a esta simpática palavra, que um dia foi criada, repetida algumas vezes, teve uma existência efêmera e logo morreu uma morte pene-latina. Digo isso por que não teve a oportunidade de influenciar algumas dezenas de idiomas. Homenageio aqui a imaginação de um colega, provavelmente, próximo, que pariu a jaroleta. Viva a jaroleta.